COLABORE

Cáritas encerra formação com estratégias de defesa de territórios frente avanço da mineração

Áreas de Atuação

Agentes Cáritas e lideranças comunitárias pontuaram as ameaças causadas pela mineração e pelo avanço da transição energética.

Publicação: 20/01/2025


Com o objetivo de fortalecer a atuação da Rede Cáritas Minas Gerais nas pautas socioambientais, a Cáritas MG encerrou, no dia 17 de janeiro, o ciclo de formação “Crise climática, transição energética e os direitos da natureza” com um último módulo que desenhou, junto aos participantes, estratégias de defesa de comunidades do estado frente a constante ameaça do neoextrativismo. 

O ciclo de formação, realizado ao longo de 2024, foi uma ação do Projeto de Incidência na Pauta da Mineração (Pipam), executado pela Cáritas MG, que buscou qualificar agentes Cáritas das 15 dioceses do estado, pessoas voluntárias e lideranças comunitárias, alinhando práticas e estratégias para a defesa da Casa Comum.

O primeiro módulo, realizado em julho, de forma presencial, na etapa de Monitoramento do PMAS (metodologia de gestão que engloba as etapas de Planejamento, Monitoramento e Avaliação), abordou as ações que nos fizeram chegar até ao contexto de crise climática e suscitou reflexões sobre a atuação da Cáritas em diferentes cenários frente às consequências socioambientais. 

O segundo, no dia 17 de setembro, discutiu o tema “Transição energética, 'capitalismo verde' e a exploração da nossa Casa Comum”. Embora a transição energética seja fundamental para reduzir a dependência de combustíveis fósseis, também gera inúmeros impactos socioambientais, principalmente em comunidades vulnerabilizadas, aprofundando o racismo ambiental – e estes foram os pontos de discussão dos participantes da formação.

No dia 22 de outubro, o terceiro módulo trouxe para o centro de debate os Direitos da Natureza no contexto do neoextrativismo. O conceito deste direito, que tem ganhado força internacionalmente, propõe que a natureza seja reconhecida como sujeito de direitos, o que significa que os ecossistemas teriam proteção legal própria. No Brasil, essa ideia ainda está em construção, mas já começa a ganhar visibilidade, especialmente em debates sobre o impacto da mineração e da exploração de recursos naturais.

O quarto e último módulo, realizado no dia 17 de janeiro de 2025, aprofundou a reflexão sobre os caminhos que a Cáritas Minas Gerais pode trilhar para construir uma sociedade fundamentada no Bem Viver. A abordagem central foi a identificação das diferentes ameaças a comunidades e ao meio ambiente, promovidas pelo avanço do neoextrativismo e pelo argumento da transição energética. A partir deste levantamento, os participantes pontuaram as possibilidades de defesa de seus territórios, com base nos conhecimentos construídos no ciclo de formação, alcançando mão, principalmente, de estratégias de advocacy com base nos Direitos da Natureza. 

A falácia da energia “limpa” 

Durante os módulos, os participantes refletiram sobre os desafios da transição energética, especialmente no contexto do chamado “capitalismo verde”, que busca consolidar a narrativa de que é possível produzirmos, em escala global, uma energia “limpa”, livre de impactos socioambientais. Embora a transição para fontes de energia renováveis seja considerada essencial para mitigar os efeitos da crise climática, não é isenta de controvérsias. 

A mineração de recursos como o lítio e o nióbio, minerais utilizados para baterias de carros elétricos, exemplifica a complexidade desse processo. A exploração de lítio no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, foi discutida como um caso emblemático, evidenciando os impactos ambientais e sociais devastadores da mineração em uma região já fragilizada por históricas desigualdades. As comunidades locais enfrentam a degradação de seus territórios, poluição e deslocamento forçado, enquanto as grandes corporações, de capital internacional, lucram com a extração dos recursos naturais, sem um devido processo de compensação social ou ambiental.

A exploração mineral e os grandes empreendimentos, embora sejam apresentados como soluções para a crise energética, frequentemente aprofundam o racismo ambiental. As populações mais pobres, em sua maioria negras e indígenas, são as mais afetadas pela contaminação do solo, da água e do ar, e pela profunda modificação de suas formas de vida. O módulo discutiu como essas desigualdades precisam ser reconhecidas e enfrentadas, tanto no plano local, quanto global.

Racismo ambiental 

Outro ponto central das discussões foi o racismo ambiental, uma problemática que se intensifica com o contínuo avanço da mineração e da exploração predatória. As comunidades mais pobres, que já enfrentam condições de vida precárias, são aquelas que pagam o preço mais alto pela exploração de recursos naturais. A degradação do ambiente, com a poluição dos rios e a destruição das terras cultiváveis, agrava ainda mais a insegurança alimentar e hídrica dessas populações. Além disso, a resistência das comunidades a esses projetos de exploração é frequentemente ignorada ou reprimida pelas autoridades locais e pelas empresas, criando um ciclo de violência e marginalização.

Reinaldo Barberine, agente Cáritas Leopoldina, compartilhou a realidade de seu território, relatando como a mineração de bauxita e ouro tem afetado negativamente a saúde, a moradia e os meios de subsistência locais. Ele mencionou também os impactos do agronegócio, como o uso indiscriminado de agrotóxicos, que tem levado à contaminação de alimentos e à morte de animais. A luta contra essas formas de exploração é uma luta por justiça social e pela preservação da dignidade das comunidades afetadas.

Mobilização social: uma estratégia de defesa dos territórios 

A mobilização social foi apresentada como uma das principais estratégias para enfrentar esses desafios. Durante o módulo, foi enfatizado que, embora as comunidades enfrentem enormes dificuldades devido à falta de apoio institucional e à pressão das grandes corporações, a união e a organização comunitária têm se mostrado fundamentais para a resistência. A Cáritas Minas Gerais, por meio de suas dioceses, tem incentivado as comunidades a se organizar, a se fortalecer por meio da educação e da capacitação, e a criar soluções sustentáveis e coletivas, como a agroecologia e o uso de práticas que respeitem o meio ambiente e os direitos humanos.


Ana Crystina Alvarenga, coordenadora colegiada da Cáritas MG, ressaltou a importância da formação comunitária como base para a construção de um futuro mais justo e sustentável. “A Cáritas, ao trabalhar com as comunidades, busca não só ajudar a identificar os problemas, mas também fornecer ferramentas para que elas mesmas possam encontrar soluções para seus desafios. A nossa missão é promover a justiça ambiental, mas também a justiça social, garantindo que as comunidades mais vulneráveis tenham voz e possam lutar por seus direitos”, afirmou.

Caminhos para o Bem Viver

Por fim, o módulo encerrou com uma reflexão sobre o conceito do Bem Viver, que se baseia na convivência harmoniosa entre as pessoas e a natureza. Esse conceito é fundamental para a Cáritas Minas Gerais, pois representa uma visão de sociedade que coloca o bem comum acima dos interesses econômicos. O Bem Viver busca promover uma transição energética justa, que respeite os direitos das comunidades tradicionais e dos povos indígenas, e que reconheça a natureza como sujeito de direitos. É, portanto, uma visão de futuro que propõe uma relação equilibrada com o meio ambiente, onde o ser humano não é visto como explorador, mas como parte integrante do ecossistema.


Para assistir ao último módulo do ciclo de formação "Crise climática, transição energética e os Direitos da Natureza", clique aqui!

Tag