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Intercâmbio de Saberes reunirá povos latino-americanos nos territórios do Alto Médio São Francisco

Áreas de Atuação

A iniciativa será realizada pela Cáritas França através da parceria com a Articulação Semiárido Brasileiro e Cáritas Diocesana Januária.

Publicação: 29/08/2024


Ação integra o processo de planejamento do 4º intercâmbio de saberes do Programa de Comunidades Resilientes ao Modelo de Transição Ecológica Justa, realizado pela Cáritas França, em países da América Latina.

Foto: Visita de articulação do intercâmbio internacional na comunidade quilombola de Croatá, em Januária.

O conhecimento dos povos indígenas e tradicionais têm norteado a construção de estratégias de adaptação ao contexto das mudanças climáticas, a partir da sustentabilidade dos territórios e do respeito à biodiversidade.  Com o olhar dedicado a essa questão, entre os dias 13 e 14 de agosto, representantes da Cáritas Diocesana de Januária e da Rede Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) acompanharam o agente da Cáritas França na visita aos territórios tradicionais da região do Baixo São Francisco. A iniciativa é fruto da parceria da Rede ASA e da Cáritas França para a construção do intercâmbio de saberes para fortalecimento de comunidades resilientes pela transição ecológica justa na América Latina. 

O intercâmbio internacional busca fortalecer o diálogo entre povos tradicionais latinoamericanos, a partir da temática: territórios na defesa do acesso e cuidado à água. Walter Prysthon, encarregado de projetos da Cáritas França na América Latina, explica que essa iniciativa nasce com a proposta de partilhar experiências exitosas de tecnologias sociais entre comunidades que enfrentam escassez de água devido ao impacto de grandes empreendimentos no território e ao contexto das mudanças climáticas. “A proposta do intercâmbio é fortalecer mulheres e homens para serem atores de transformação social na defesa dos seus territórios tradicionais e na transição ecológica justa”, explicou.

Em sua 4ª edição, a ação será realizada, durante o 1º trimestre de 2025 em três territórios de povos indígenas e tradicionais do Baixo São Francisco: comunidade quilombola de Croatá e Sangradouro Grande, em Januária, e a comunidade indígena Xakriabá em São João das Missões. Ao refletir sobre a importância da iniciativa, Juliana Bavuzo, coordenadora do Programa 1 Milhão de Cisternas e representante da Rede ASA, pontuou que historicamente a troca de saberes entre povos tradicionais tem sido uma estratégia de resistência dos povos do semiárido e uma metodologia de trabalho da Rede na construção do Programa de Convivência com o Semiárido. “Para nós, da ASA, esse intercâmbio com comunidades brasileiras, peruanas e bolivianas é muito importante porque reforça os laços dos povos da América Latina e mostra a importância de unir conhecimentos tradicionais e conhecimentos científicos que mostram alternativas de resistência ao modelo predatório da biodiversidade”, explica.


Foto: Lideranças do Quilombo da Gameleira dialogam sobre sobre as ações coletivas em prol da agroecologia e cultura tradicional no território. 

Valmir Lopes, agente da Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais, destaca que a iniciativa é muito importante para a valorização da cultura dos povos e comunidades tradicionais. Ele reflete que a relação com o rio São Francisco une as lutas de todos os territórios que vão participar do intercâmbio de saberes, em Januária e em São João das Missões.  “Há muito conhecimento em cada uma dessas comunidades e é fundamental construir essas pontes com comunidades da América Latina. Além das experiências das visitas nas comunidades, o intercâmbio irá construir um documento base sobre a luta dos povos tradicionais pela defesa das águas e das florestas”, reflete.

A diversidade socioambiental do Alto Médio São Francisco

 Ao longo de 31.150,94 km², a região do Alto Médio do Rio São Francisco é formada pela diversidade sociocultural dos povos indígenas, quilombolas, veredeiros, vazanteiros e geraizeiros. Das margens do São Francisco até o Peruaçu, quem anda por este território pode ver a transição do Cerrado para Caatinga e para Mata Atlântica. Ali, o modo de vida destes povos tradicionais tem mostrado alternativas de convivência com a biodiversidade, a partir de práticas sustentáveis. 

Quilombo de Croatá 

Com quase meio metro de comprimento, o tambor roncador é feito através de um tronco de árvore. Só é possível tocá-lo em duplas, uma pessoa senta e toca a percussão enquanto outra toca o bumbo do tambor com água. Enedina Silva conta que o instrumento garante a alegria e a batucada durante as festas no Quilombo do Croatá, em Januária. Quilombola e vazanteira, ela nasceu e cresceu às margens do Velho Chico, no Norte de Minas. Desde criança, ela aprendeu que era preciso plantar nas barrancas das vazantes respeitando o ciclo das águas, durante os tempos de baixa. Foi a partir deste saber tradicional que ela criou os seus quatro filhos com alimentos nutritivos e sem veneno, no Quilombo do Croatá, em Januária. Entretanto, apesar da fartura do passado, hoje ao falar sobre o rio São Francisco, ela faz um alerta:” a gente tá vendo que o rio tá doente, tem muito lodo na água, tá difícil achar peixe. A gente precisa deixar o rio respirar e lutar contra a poluição que tem sido jogada nele, porque isso contamina a terra das vazantes”. Segundo Enedina, a única alternativa de água potável do território se dá através da cisterna de captação de água de chuva com capacidade de 16 mil litros, implementada através do Programa de Convivência com o Semiárido da Rede Articulação Semiárido Brasileiro (ASA). Ela reflete que é importante lutar pela preservação das águas e das matas, porque só assim a comunidade terá um futuro no território.



Foto: Apresentação de batuque com o tambor roncador no Quilombo de Croatá, em Januária.


Quilombo de Gameleira


Foto: Apresentação da dança de São Gonçalo na comunidade quilombola de Sangradouro Grande, em Januária.

“Com 60 anos, eu sigo na luta pela defesa do nosso território, porque amanhã eu quero que meus netos vejam a natureza de pé”, afirma o quilombola Sinvaldo Paixão. Há várias gerações, a família de Sinvaldo vive no Quilombo Gameleira, em Januária. Ali, cerca de 3 mil famílias lutam pela titulação do território que está localizado à margem  esquerda do rio São Francisco. 

Terra Indígena Xakriabá 

 “A natureza nos ensina viver e a respeitar o ciclos, precisamos aprender a compreender o tempo de crescimento do alimento não dá para acelerar isso e achar que não vai ter impacto em nossa saúde”. Essa compreensão de cuidado com a terra e o alimento tem mobilizado a comunidade Xakriabá para atuar em projetos de cultivo de forma coletiva. Adailton Cavalcanti, agente de saúde e liderança do território Xakriabá, relata que durante muitos anos a comunidade vivenciou períodos longos de estiagem, situação que afetava os modos de vida da comunidade. De acordo com ele, a recuperação ambiental tem sido uma das frentes de resistência da comunidade. Parte desse processo está sendo construído através da Associação de Agricultores Familiares. “Nós estamos doando kit de horta nas aldeias, oferecendo apoio para quem quer plantar. Hoje, a partir da nossa produção, nós estamos fornecendo alimentos para o Programa de distribuindo Aquisição de Alimentos (PAA), vendemos feijão catador , polpa de fruta, milho, melancia”, afirma. A iniciativa além de gerar renda para as famílias agricultoras, oferece alimentos de qualidade para além das fronteiras da aldeia.


Foto: Horta agroecológica na Aldeia Riacho do Brejo, em São João das Missões.

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