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Núcleo de Acompanhamento de Reparações por Desastres visita território atingido em Mariana

Geral

Representantes de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo, Zona Rural e de comunidade quilombola puderam falar sobre as dificuldades vivenciadas

Publicação: 24/02/2025


O Núcleo de Acompanhamento de Reparações por Desastres (NUCARD) do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) visitou o território atingido pela mineração em Mariana durante a última quinta-feira (20). O objetivo foi realizar uma escuta das pessoas sobre o processo pós-repactuação. Desde que o acordo foi homologado, em 06 de novembro de 2024, substituindo o acordo firmado em 2016, novas medidas estão sendo implementadas na reparação e atualmente, entre outras atribuições, o NUCARD é responsável por coordenar e supervisionar o cumprimento dos acordos de reparação dos rompimentos das barragens de Mariana e Brumadinho, ocorridos, respectivamente, em 2015 e em 2019. 

Foto: Maria Luísa Sousa

O encontro também teve a participação de representantes da Defensoria Pública, Governo do Estado, Cáritas MG|ATI Mariana e Sindicato Rural e foi dividido em dois momentos. Durante a manhã, foi realizada uma caminhada por Bento Rodrigues (origem), onde foram expostas várias angústias da comunidade, especialmente no que se refere à desapropriação de terras e à necessidade de reconstituição da Capela de São Bento, hoje em ruínas. Moradores locais destacaram a importância histórica e religiosa do templo que foi devastado pela lama de rejeitos. Também foi discutida a continuidade do restauro da Capela de Nossa Senhora das Mercês, patrimônio tombado. 

“Quando a lama chegou, ela não tinha escritura de terra, só foi entrando” 

No período da tarde, moradores e moradoras das comunidades atingidas de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo, Zona Rural e de comunidade quilombola relataram os problemas mais urgentes que surgiram a partir da assinatura do novo acordo. O encontro foi realizado no escritório da Comissão de Atingidos e Atingidas pela Barragem de Fundão, na sede do município. Em relatos preocupados, foram citadas questões como a inviabilidade de alguns prazos previstos, e a dificuldade de atender à comprovação por documentação para acesso ao Cadastramento Nacional da Agricultura Familiar (CAF), exigido pelos termos da repactuação para que as pessoas consigam acessar o Programa de Transferência de Renda (PTR) Rural. 

Ainda em relação a esse cadastramento, foi compartilhada a situação de Mariana, em que apenas dois órgãos realizam os cadastros, sendo eles o Sindicato Rural e a Emater. De acordo com o representante do Sindicato Rural, Josimar Carvalho, o prazo até 6 de março deste ano não é suficiente para a emissão dos, aproximadamente, 500 cadastros de produtores rurais existentes, considerando as três pessoas credenciadas para exercer tal função e a morosidade implicada no sistema do Governo. 

Diante dessa situação, as lideranças da Zona Rural temem por mais perdas de direitos e de reconhecimento, apontando uma demanda urgente por prorrogação do prazo estipulado no recente acordo. Outro ponto debatido foram as condições de moradia nos reassentamentos coletivos de Paracatu de Baixo e Bento Rodrigues, com várias famílias enfrentando dificuldades devido à falta de terras e espaços férteis para cultivo, além de edificações que apresentam problemas estruturais. A ausência de um projeto de reparação sólido para a retomada dos modos de vida compromete a qualidade do cotidiano nos reassentamentos e contribui para o aumento do sofrimento das pessoas atingidas, que se veem agora diante das determinações da repactuação, muitas delas sem aderência à realidade enfrentada, considerando as demandas dos territórios. 

Foto: Maria Luísa Sousa

A situação dos animais que vivem na Fazenda da Fundação Renova (em liquidação) também foi levantada durante o encontro. Mais uma vez, a preocupação envolve os prazos, neste caso, aqueles estabelecidos para a devolução das espécies, sem estabelecer condições adequadas de abrigo. O fato é que muitos moradores ainda se encontram em situações de moradia provisória - não foram reassentados, assim não têm a infraestrutura mínima necessária para garantir o bem-estar dos animais. A outra opção proposta na repactuação, consiste na venda dos animais por intermédio das empresas, no entanto, a tabela de valores está desatualizada. Em pesquisa de mercado, as pessoas atingidas sugerem que os preços indicados correspondem ao ano de 2016. 

Por sua vez, a comunidade quilombola de Mariana também trouxe à tona suas preocupações sobre a falta de diálogo com as autoridades pós-repactuação ter gerado um sentimento crescente de abandono. 

Diante de todos os relatos, a representante do NUCARD, Dra. Shirley Oliveira, disse que “há um acordo e precisamos pensar na necessidade de fazer o melhor possível”. A promotora também reforçou a impossibilidade de tratar das questões individuais e reconheceu a problemática dos prazos curtíssimos que é necessário pensar em encaminhamentos possíveis. 

Em relação à repactuação, a Defensoria Pública explicou a situação atual por meio de uma metáfora, comparando-a a roupas prontas compradas em massa, que, embora sirvam para muitas pessoas, precisam de ajustes para atender às necessidades de algumas, sugerindo que quem não enquadra nos moldes da repactuação deve procurar a justiça comum. 

Para a Cáritas MG|ATI Mariana, é fundamental que as instituições envolvidas na mesa de repactuação viabilizem a escuta das comunidades atingidas, se comprometendo a considerar as demandas, promovendo encontros regulares e espaços de participação onde as questões e preocupações possam ser debatidas abertamente. De acordo com o coordenador do projeto, Rodrigo Pires, “é necessário criar mecanismos que permitam um acompanhamento contínuo das reparações e da implementação das medidas acordadas junto às pessoas atingidas, afinal os interesses e necessidades delas devem ser sempre prioridade”.


Por Maria Luísa Sousa, da Cáritas MG|ATI Mariana

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