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Audiência Pública promove debate sobre os impactos da mineração nos recursos hídricos

Projetos

Moradoras e moradores das 13 comunidades e reassentamentos debatem sobre a água na Câmara Municipal de Conceição do Mato Dentro.

Publicação: 17/03/2023


“A gente hoje passa por muitos problemas com relação à água. Nós não temos uma água de quantidade e nem de qualidade mais. Já passamos muitos problemas ali em Gondó; ressecamento de nascente, assoreamento dos rios… Tem região lá que a água é uma água sem filtrar, é uma água amarela. Tem problema também que já deu morte de animal por usar essa água. Hoje a pessoa não tem uma produção boa, uma produção grande, porque não tem uma quantidade de água” relatou Valter, morador da comunidade de Gondó, na Audiência Pública que aconteceu no dia 07 de março na Câmara Municipal de Conceição do Mato Dentro. A Audiência teve como objetivo de tornar público e debater os impactos da mineração nos recursos hídricos da região.

Estiveram presentes representantes do Ministério Público de Minas Gerais; da Prefeitura de Conceição do Mato Dentro; da Prefeitura de Dom Joaquim; das Assessorias Técnicas Independentes Cáritas e Nacab; da Anglo American, além de representantes das 13 comunidades atingidas e reassentamentos; do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (GESTA/UFMG); entre outros atores. 

Fotos:  Cecília Santos/Cáritas ATI 39

No início da Audiência o Promotor de Justiça da Comarca de Conceição do Mato Dentro, Caio Dezontini Bernardes, abriu o espaço para que moradoras e moradores das 13 comunidades atingidas pela mineração relatassem os problemas vivenciados com relação à redução da quantidade e qualidade da água desde a fase de instalação da mineradora. Além de denunciarem questões comuns entre as comunidades, as pessoas atingidas também cobraram que a Anglo American apresentasse respostas e soluções para os seus problemas. 

“Antes da mineração chegar nas comunidades, nunca faltou água. [...] Tinha rio, tinha os peixes, os bois sempre bebiam água no rio. Depois que a mineração chegou, acabou com tudo e não acabou só com a água. Acabou com a vida, com a cultura, com a identidade… Primeiramente eles destruíram a cachoeira de Passa Sete, colocando um mar de lama em cima da nossa cabeça. Depois, em 2014, mataram o rio, poluíram todo o rio e mataram os peixes. Por que só depois da mineração a água foi poluída? Por que só depois o rio foi morto? Por que só depois da mineração as nascentes secaram? [...] Acabou com a área de lazer do povo, acabou com a agricultura familiar. [...] Eu peço que vocês olhem pelas nossas comunidades, pela nossa vida mesmo”, relatou Elizete Pires de Sena, moradora de Passa Sete. 



Assim como Valter e Elizete, outras pessoas também apontaram sobre a escassez da água, a poluição, o assoreamento dos rios, o ressecamento de nascentes e outros problemas que iniciaram após a chegada da mineradora. “No contexto atual, a nossa comunidade se vê limitada quanto aos diversos usos que fazia do rio, tendo em vista a poluição que nos proíbe de usufruir desse recurso hídrico”, relatou Silvana Moreira, moradora de Itapanhoacanga.

A insegurança hídrica nas comunidades vai além da preocupação de estarem consumindo uma água provavelmente poluída, uma vez que as famílias vêm percebendo a redução dos cursos d’água e o ressecamento de nascentes. Nesse sentido muitos se perguntam também sobre a quantidade de água que a empresa utiliza. “Nós não sabemos qual é a quantidade de água que a empresa retira da nossa região para esse mineroduto, que é um dos maiores minerodutos do mundo” pontuou Carlos, morador da comunidade de Córregos.


Comunidades cobram respostas e soluções à Anglo American sobre a segurança hídrica

Essa, porém, não foi a primeira vez que as comunidades denunciaram os impactos da mineração nos rios e nascentes da região. Há anos elas vêm relatando seus sofrimentos e cobrando projetos da Anglo American que visem solucionar essas questões.  “Cabe a mim, também, lembrar as promessas de investimento que foram feitas pela empresa Anglo American há mais de 10 anos, no sentido de que iria construir uma estação de tratamento de água e esgoto na comunidade, em convênio com a prefeitura de Alvorada de Minas, para sanar os problemas enfrentados por nós. Eu estava presente e eu ouvi” relatou Silvana.

De acordo com a moradora, a estação de tratamento de água e esgoto na comunidade nunca foi construída. “O projeto nunca foi desenvolvido de fato, deixando-nos a mercê de uma urbanização acelerada, sem os devidos cuidados com o bem-estar e qualidade de vida de seus habitantes”.

Na comunidade de Gondó, Valter acrescentou que apenas 13 famílias são abastecidas por meio do poço artesiano. A comunidade vem cobrando a implantação de um plano de abastecimento para todas as localidades que não são reconhecidas como Áreas Diretamente Atingidas e, portanto, não estão abarcadas pelos planos e programas da Anglo American. O pedido revela a necessidade de uma revisão das localidades que são consideradas atingidos pela mineração, algo que as comunidades também vêm cobrando ao longo dos últimos anos. “A gente queria que criasse esse plano de abastecimento para essas outras localidades de Gondó, principalmente Diamante, Ribeiro, Solidão, Retiro São Francisco e Buritis que são uma comunidade, que são Gondó e a Anglo desconsidera que não são Gondó, e tá passando muito sofrimento o povo com relação à água”, explica Valter.

Já para a comunidade de Córregos, Carlos solicitou que “seja incluída no Programa de Gestão de Recursos Hídricos (PGRH), que se faça um novo estudo socioambiental na comunidade, para que nós possamos também ter ações previstas de monitoramento da qualidade e da quantidade de água. Pedimos, também, que sejam cumpridas as condicionantes”.


A permanência das Assessorias Técnicas Independentes Cáritas e Nacab também foi outro ponto importante levantado pelas moradoras e moradores. “Hoje a gente depende muito da continuidade também da Assessoria da Cáritas com a gente, porque já pensou se ficar alguns meses sem a Cáritas com a gente em Gondó? A gente pode ser muito prejudicado, porque hoje é a Assessoria que tá nos acompanhando, que tá nos orientando, se nós conseguimos esse poço foi com a força da Assessoria. [...] Hoje eu conto muito com a colaboração do Ministério Público, do pessoal que tá aí presente nos ouvindo”, afirmou Valter. 

Já o morador de São José do Jassém, José Maria, ressaltou a importância dessa Audiência Pública, espaço em que está sendo discutido sobre a vida e o futuro das pessoas e comunidades atingidas. “Que bom que hoje nós estamos aqui para falar sobre a água, mas vamos pensar só 1 minutinho… A água serve pra tudo, né? Nós estamos aqui, cada qual já usou a água hoje não é verdade? Para o banho, para sua comida, para sua bebida… Mas nós não estamos aqui só por causa da água não, estamos aqui por causa da vida. Se não tivermos água para poder beber, nós vamos morrer! [...] Nós estamos aqui defendendo o nosso direito de viver. No futuro vem a nossa juventude, vem às nossas crianças, se não tiver quem lute por eles, como sobreviverão?”.

Após o momento de fala das pessoas atingidas, as Assessorias Técnicas Independentes tiveram um espaço para apresentar os estudos sobre os recursos hídricos das 13 comunidades, que foram realizados pelo Grupo de Trabalho da Água, onde foi apresentada, com argumentos técnicos, a influência da atividade minerária na redução da quantidade e da qualidade da água na região. Em seguida, a Anglo American também teve um espaço para uma exposição sobre a gestão da mineradora em relação aos recursos hídricos. 



Ao final do encontro, o Ministério Público listou os pontos que serão encaminhados a partir da Audiência Pública. Veja quais foram, acessando o vídeo a seguir: 



Por equipe de Comunicação Cáritas|ATI 39

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