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Consea-MG promove debate sobre desmonte das políticas públicas de segurança alimentar e nutricional

Áreas de Atuação

Em roda de conversa virtual, conselheiros e convidados refletem sobre os retrocessos na garantia do direito humano à alimentação adequada,

Publicação: 13/04/2021


Em plena pandemia do Covid-19, mais de 19 milhões de pessoas no Brasil, ou seja, cerca de 9% da população, estão passando fome. Se somadas às mais 44 milhões de brasileiras e brasileiros que não contam com alimentos em quantidade suficiente, o país totaliza aproximadamente 55% da sua população convivendo com a insegurança alimentar moderada a grave, o que significa dizer, em números absolutos, que 116,8 milhões de brasileiros não têm acesso pleno e permanente a alimentos. Os dados alarmantes são do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado em dezembro de 2020 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN). A pesquisa escancara o que a população do país vivencia no seu dia a dia: nos últimos anos, é cada vez maior o número de pessoas com fome. 

Para refletir sobre o aumento da fome no Brasil e propor estratégias para o cumprimento da política de segurança alimentar e nutricional, o Consea-MG (Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional de Minas Gerais) promoveu a roda de conversa virtual “O desmonte das políticas públicas de SAN e papel do controle social”. Realizada no Dia Mundial da Saúde – 7 de abril, a atividade integrou as plenárias ordinárias do Conselho e contou com a assessoria da antropóloga do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) e ex-presidenta do Consea nacional, Maria Emília Pacheco, e do presidente do Consea do Espírito Santo, Rosemberg Moraes Caitano. 

Participaram da roda de conversa conselheiros e integrantes das comissões regionais do Consea-MG, pesquisadores de universidades e integrantes dos Conseas da região sudeste e de outros estados do país. A atividade contou com a moderação do conselheiro territorial do Alto Jequitinhonha pela Articulação do Semiárido Mineiro (ASA Minas), Valmir Soares Macedo, e com a animação do cantador e educador popular, Sebastião Farinhada.

Durante toda a atividade, diversos participantes parabenizaram o Consea-MG pela iniciativa e também pela eleição da primeira mulher a ocupar a presidência no estado em 22 anos da existência do Conselho. Em janeiro desse ano, a assessora da Cáritas Regional MG, Renata Siviero, foi eleita presidente do Conselho para o biênio de 2021-2022. Siviero falou sobre os objetivos dos momentos de análise de conjuntura na abertura das plenárias ordinárias do Consea: "A gente entende que esse momento de diálogo ao redor de um tema importante contribui para nossas reflexões e para nossa militância, contribui também para olharmos quais caminhos podemos percorrer e como vamos percorrer". A plenária ordinária do Consea-MG se estendeu aos dias 8 e 9 de abril com participação dos conselheiros e integrantes das comissões regionais.

Enfrentar a Fome com a força das nossas Lutas

Durante a roda de conversa, Maria Emília Pacheco destacou dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil: “Estamos regredindo em 5 anos o que alcançamos em 15. É um retrocesso que deve nos levar a pensar muito profundamente e divulgar essa informação junto à sociedade”. A antropóloga explicou que os maiores índices no cenário da fome no país estão concentrados nas regiões Norte e Nordeste, em domicílios chefiados por mulheres, em sua maioria negras. “Esse cenário grave de fome volta a demonstrar, principalmente, que existe uma diferença no Brasil, uma desigualdade entre as regiões, uma desigualdade de classe, uma desigualdade étnica, racial e de gênero”, afirmou. 


A antropóloga e ex-presidenta do Consea Nacional, Maria Emília Pacheco, participa da roda de conversa virtual.

Pacheco chamou atenção dos participantes sobre a inter-relação da luta pela a garantia ao direito humano à alimentação com as pautas feministas e antirracistas: “Nós precisamos ter a garantia do direito humano à alimentação, de uma alimentação adequada e saudável, mas também em contextos em que coloquemos em questão a desigualdade entre homens e mulheres e o racismo estrutural. Essa é uma interação necessária em nossa pauta de lutas”.

Para Maria Emília, atividades como a roda de conversa são importantes enquanto espaços de resistência e de organização da sociedade civil, em especial, no contexto atual de um governo federal que se coloca contra a participação social. “É hora de dizermos um basta, de lutar por limites, porque estamos vivendo em uma sociedade sem limites de destruição, mas, ao mesmo tempo, é hora de defender, aplaudir e celebrar essas formas de resistência que temos dos movimentos no campo, na cidade e na floresta para construirmos um novo amanhã”, concluiu.

No início da sua fala, o presidente do Consea do Espírito Santo, Rosemberg Moraes Caitano, contou sobre o espanto dos conselheiros do Consea ao tomar conhecimento da primeira Medida Provisória do governo Bolsonaro, MP nº 870, no dia 1º de janeiro de 2019, a qual extinguiu o Consea nacional. “Essa medida estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e traz a caneta em forma de punhal: sangra o Consea, fragilizando todo o Sisan [Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional]. Ela compromete os processos de garantia de direito humano à alimentação adequada em todas as esferas de governo”, lembrou. Rosemberg elogiou a organização dos Conseas estaduais para manter os conselhos em funcionamento diante de tal MP. Após essa breve fala, ele não pôde mais participar da roda de conversa devido a problemas técnicos.


O advogado e ex-conselheiro do Consea Nacional, Rosenberg, durante a roda de conversa virtual.

A presidente do Consea do Rio de Janeiro, Renata Machado, foi convidada a explanar sobre o desmonte das políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. Machado explicou que algumas ações, como a extinção do Consea Nacional, são facilmente percebidas no processo de desestruturação do Sisan. No entanto, em outros casos é preciso um olhar mais atento para identificar o processo de desmonte das políticas públicas, como é o caso do corte de recursos para os programas destinados à garantia do direito humano à alimentação adequada. “Vou dar um exemplo: o PAA [Programa de Aquisição de Alimentos]. Oficialmente ele não foi extinto, mas o que você faz? Corta o recurso. Sem o recurso, ele é infinitamente menor do que era há pouquíssimos anos atrás”, afirmou.

Machado enfatizou a rapidez das perdas políticas: “A gente demora um tempo enorme para dialogar e construir e para desfazer é muito rápido, a desconstrução é muito rápida”. Diante do cenário de retrocessos, a presidenta do Consea-RJ finalizou convocando os participantes a pensar estratégias para solidificar os direitos conquistados. 

Foto destaque: Francielle Oliveira / Cáritas MG, durante Banquetaço em Belo Horizonte, realizado em 27 de fevereiro de 2019.


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