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O que é ser atingido? (parte 2)

Geral

O que é ser atingido é uma série que apresenta a perspectiva dos moradores e moradoras das comunidades atingidas pelo Projeto Minas-Rio.

Publicação: 31/01/2023


Na edição 17 do Balaio impresso, veículo informativo da Assessoria Técnica Independente Cáritas|ATI 39, iniciamos a reflexão sobre o conceito de “atingidos”, a partir das perspectivas de moradores e moradoras das comunidades de Córregos e de Gondó. 

Foto de moradores e moradoras de Córregos, comunidade atingida de Conceição do Mato Dentro. 


O conceito de atingidos pela mineração ainda é algo em construção. De acordo com Parecer realizado pelo GESTA, sobre o documento “Estudo de Atualização das Áreas de Influência (AI) do Projeto Minas-Rio Mineração”, elaborado pela empresa de consultoria Ferreira Rocha Gestão de Projetos Sustentáveis, ser atingido está presente em diferentes dimensões, como:

Atingidos territorialmente: grupos que são deslocados de um território específico devido à implantação de uma mina; sejam eles proprietários com título, populações tradicionais ou ribeirinhas; 

Atingidos economicamente: indivíduos que, apesar de não serem deslocados, sofrem pela interrupção do acesso a áreas produtivas ou a recursos de subsistência. (...) Entre eles, podem estar comunidades extrativas que deixam de ter acesso à floresta, pescadores cuja pesca diminui devido à mudança na qualidade da água ou ainda trabalhadores que perderam o emprego devido à mudança da dinâmica econômica após abertura (ou fechamento) da mina. 

Atingidos por subprojetos: pessoas que foram prejudicadas na implantação de infraestrutura ou projetos de apoio à operação das minas (...). 

Atingidos socialmente: aqueles que sofreram devido ao aumento de preço (de terras, moradia, alimentos etc) após o início da instalação da mina. Inclui ainda as pessoas expostas a situações de risco – tais como prostituição, uso de drogas e violência – que emergiram depois da chegada dos novos trabalhadores; 

Atingidos ambientalmente: pessoas que passam por processos de perda de qualidade de vida, devido a mudanças que podem incluir poluição sonora ou mesmo modificação da paisagem (adaptado de Wanderlei, 2009).



“Eu entento que nós moradores de Córregos somos atingidos pelo Projeto Minas-Rio da mineradora Anglo American porque a região onde nós moramos e a nossa comunidade tem sido afetada desde o início da implantação desse projeto na região. 

O primeiro impacto foi a chegada de pessoas estranhas no início, trabalhadores, o que gerou inclusive questão judicial e houve o impedimento de que pessoas se alojassem aqui, então essa questão foi resolvida. Um outro impacto é o aumento do tráfego de veículos das mais diversas espécies, por motivos diferenciados, mas todos direta ou indiretamente ligados à mineradora: trânsito de caminhões, trânsito de veículos de empresas que vieram atuar na região justamente para atender as condicionantes, nós podemos citar os próprios veículos da Cáritas por exemplo, ou do Instituto Espinhaço. E eu tô citando essas duas pra dizer que nem sempre esses veículos vêm por um motivo que seria negativo pra comunidade, né? A Cáritas tem um papel fundamental na ajuda da comunidade nessa luta. O Instituto Espinhaço é uma proposta super interessante, nós abrimos nossas portas pra eles… Mas são veículos, são pessoas, são atitudes que alteram a rotina e a cultura local. Nesses dois casos, uma alteração positiva, mas há outras que são negativas. E esses veículos, além de alterarem a rotina passiva do lugar, trazem também problemas estruturais: vibração, rachaduras nas casas, o aumento do trânsito que é uma espécie de violência. 

Mas há outros problemas também, relacionados à própria atuação da empresa, por exemplo, um ressecamento, uma perda de quantidade de água, a notícia de secamentos de nascentes… Eu não estou afirmando que essas nascentes secaram por causa da Anglo, mas sabendo que uma empresa desse tipo altera os lençóis freáticos e que coincidiu com a chegada dela a perda dessa quantidade de água, então até hoje é uma coisa que não foi explicada pra nós. 

E dois impactos que são inegáveis: o ruído, né, em várias regiões no entorno de Córregos o ruído da mina interfere nas características naturais do lugar, principalmente a noite, é possível ouvir os barulhos das máquinas; e a poeira, nós agora estamos em época de chuva, esse fenômeno não afeta tanto, mas na época de seca a quantidade de poeira que chega sobre toda região é absurda, principalmente sobre as folhas das plantas, levando em consideração que muitas dessas plantas são comidas, isso pode fazer risco à saúde, porque a gente não sabe como esse pó de minério se acumula em nosso organismo. Então são essas as principais características, né? Transformações na cultura e também transformações no ambiente”. (Carlos Mitraud, morador de Córregos).


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