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Sementes crioulas: dons de Deus e patrimônio da humanidade

Áreas de Atuação

Cáritas promove fortalecimento das casas de sementes e incentivo à troca, levando variedades do Norte de Minas para Vale do Jequitinhonha.

Publicação: 27/07/2021


“Nossa maior felicidade vai ser quando Deus mandar a chuva e a gente jogar a semente no chão”, contou o agricultor Valteir Peixoto, da comunidade de Caldeirão, em Itinga, ao receber da Cáritas as sementes crioulas produzidas por Geraldo Gomes, também agricultor do município de Serranópolis de Minas. O guardião das sementes crioulas Valteir mora no Vale do Jequitinhonha, uma região semiárida e de caatinga, e sabe que só com a chegada das águas é que as sementes poderão ser plantadas.

Durante o mês de julho, a Cáritas Regional Minas Gerais promoveu uma série de atividades de fortalecimento das casas de sementes e de incentivo à troca, levando variedades produzidas pelos guardiões Geraldo Gomes e Amintas Luiz, do município de Serranópolis de Minas, no Norte do estado, para as comunidades de Caldeirão, município de Itinga, e Paraguai, em Felisburgo, no médio e baixo Jequitinhonha, respectivamente. Através do Programa de Resgate, Conservação e Produção de Sementes Crioulas, a Cáritas tem fomentado a troca e o resgate dessas sementes no estado. Ao todo, o programa acompanha e assessora 70 casas de sementes, só no Vale do Jequitinhonha são cerca de 40.  


Rodrigo Pires, secretário regional da Cáritas Minas Gerais, entrega as sementes crioulas para o guardião Valteir Peixoto, da comunidade Caldeirão, em Itinga.

Valteir integra a rede de guardiãs e guardiões de sementes crioulas, que conta com o apoio da Cáritas Regional, junto a diversas organizações sociais, no resgate, armazenamento, plantação e compartilhamento de sementes em Minas Gerais e no Brasil. Ele explica que a função do guardião não é só plantar e resgatar as variedades, mas dividir com as outras pessoas da comunidade as sementes recebidas: “Vamos passar um pouquinho para cada um, porque não sou eu sozinho que vou plantar. Você sabe que o guardião tem que passar para outras famílias também”. 

As atividades do Programa de Sementes Crioulas da Cáritas desse mês iniciaram no Norte de Minas, onde foram adquiridas variedades na casa de sementes com os guardiões Geraldo e Amintas, em Serranópolis de Minas. Parte dessas sementes, as mais adaptadas ao clima semiárido e seco, foram entregues na comunidade Caldeirão, em Itinga. E uma quantidade maior foi entregue às guardiãs e aos guardiões de sementes durante encontro realizado no dia 18, na comunidade Paraguai, município de Felisburgo. 

O secretário regional da Cáritas Minas e coordenador do programa, Rodrigo Pires, explica que no baixo Jequitinhonha, por meio de parceria com a assessoria da deputada Leninha (PT-MG), na pessoa do guardião e comunicador popular Decanor Nunes, foi criado um grupo com 70 pessoas em uma rede social chamado “Troca de sementes crioulas”. O encontro presencial para entrega das sementes contou com a participação de algumas pessoas desse grupo, que irão separar, armazenar nas casas de sementes e distribuir parte das variedades recebidas para os demais integrantes. 

“Se o guardião pega uma semente e já tem a terra e a água, com esses dons de Deus – terra, água e semente – eles vão ter fartura. Então, estimular a troca de sementes é estimular que em cada quintal e em cada roça tenham mais agrobiodiversidade”, explica Rodrigo. Nas atividades na região do Baixo Jequitinhonha foram distribuídos 500kg de sementes, entre elas, variedades raras como: milho ouro velho, milho vinhedo, milho preto 8,5, milho cunha, milho coruja, milho colorido, milho  pipoca colorido, milho amarelão, milho azul, milho canjica branca, milho pipoca vermelho, feijão azuki, fava carioca, feijão enchente grande, feijão custelão, feijão catador vermelho, feijão rabo de tatu, feijão paraná, feijão rosadinho, mostarda, gorutuba verde, quiabo vermelho e melancia amarela.

O guardião das sementes e integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Jorge Rodrigues Pereira, do acampamento Terra Prometida, em Felizbugo, acredita que as sementes vieram em um momento muito oportuno. “Esse ano, com as mudanças climáticas, ou seja, com o avanço da seca que vem se intensificando, nós não conseguimos produzir bastante sementes, foi muito limitado”, explica. Ele conta que os grãos produzidos na sua comunidade são inferiores e espera conseguir fazer os campos de sementes com as variedades recebidas: “Esperamos multiplicar essa semente com qualidade boa para que, no ano que vem, nós possamos fazer as trocas, a devolução e a doação de sementes”.


Encontro para entrega das sementes crioulas para as guardiãs e os guardiões da comunidade Paraguai, município de Felisburgo.

As casas de sementes geridas pelas guardiãs e guardiões são os locais de armazenamento das variedades plantadas, trocadas e adquiridas pelos agricultores. Cada agricultor pode retirar a quantidade que precisar para sua plantação, mas todos assumem o compromisso de devolver o dobro do retirado na próxima safra. “Esse é um incentivo à troca para que as sementes estejam sempre voltando para as casas e circulando”, explica Rodrigo Pires.

O agricultor e guardião de sementes, Reginaldo Antônio de Matos, da comunidade Paraguai, em Felisburgo, explica que as sementes recebidas vão ser multiplicadas e estarão disponíveis para sua comunidade e para outras do município: “Eu acredito que essa semente que veio vai ajudar não só nossa comunidade, mas as outras comunidades. Nós vamos fazer os dois campos de sementes, aí eu acredito que elas vão ajudar. Elas vão crescer muito a nossa casa de sementes e ajudar muito os trabalhadores daqui, os guardiões e guardiãs do nosso município de Felisburgo”.

Ao mandar as sementes crioulas para o Vale do Jequitinhonha, o guardião Geraldo Gomes, do Norte de Minas, também enviou uma mensagem desejando que as sementes deem bons frutos e levem muita fartura para aqueles que a receberem: “Que essas sementes sejam ricamente produtivas e que Deus abençoe a todos que vão recebê-las. Que todos tenham a consciência de multiplicar essas sementes, porque semente crioula é patrimônio da humanidade”.

Foto destaque: Casa de sementes do guardião Geraldo Gomes, na comunidade do Touro, em Serranópolis de Minas / Júlio César Santos, da Cáritas Regional Minas Gerais
Fotos matéria: Samuel da Silva, da Cáritas Regional Minas Gerais


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